Entenda como fraude à cota de gênero nas eleições pode punir dirigentes partidários; TSE julga caso

No Ceará, possível sanção ao presidente do PL Ceará, Acilon Gonçalves, está sob análise da Justiça Eleitoral

Por Ester Ferreira em 17/05/2023 às 08:23:13
Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE

Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE

A fraude à cota de gênero tem sido alvo de punições mais severas da Justiça Eleitoral. Dentre elas, a principal é a cassação do diploma de todos os candidatos – eleitos e suplentes – da chapa onde foram apresentadas candidaturas fictícias de mulheres. Outra é a determinação de inelegibilidade, por 8 anos, das candidatas identificadas como fraudulentas.

Neste cenário, um ponto tem ganhado destaque: qual a responsabilidade dos dirigentes partidários sobre a apresentação de candidaturas para burlar a legislação eleitoral? Até porque são eles que, na teoria, montam as chapas de candidatos e apresentam os registros de candidatura à Justiça Eleitoral, por exemplo.

A inclusão dos dirigentes partidários nestes processos, vai permitir uma análise das condutas deles e oferecer a comprovação "da culpa ou não" deles. "Como podem ser atingidos, considerados inelegíveis, tendem a trazer mais responsabilidade", afirma.

Especialista em Direito Eleitoral e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), Amanda Guimarães reforça que é o dirigente partidário que "está à frente" e "dá a palavra final" para definição de candidaturas e apresentação das chapas à Justiça Eleitoral.

"Não tem como o dirigente partidário não saber que está havendo fraude à cota de gênero, é o partido que inscreve a chapa", argumenta. Para a pesquisadora, essa será uma boa oportunidade para uma reformulação dos partidos.

"Para que incentivem, para que essas mulheres tenham candidaturas com condição de competição. Os partidos têm bastante mulheres filiadas, mas elas não tem incentivo partidário. Acredito que essa proposta é muito feliz e vem ao encontro dessa reformulação".

Amanda Guimarães

Especialista em Direito Eleitoral e membro da Abradep

Julgamento na Justiça Eleitoral do Ceará

No julgamento iniciado nesta segunda-feira (15) na Corte estadual da Justiça Eleitoral, um dos pontos discutidos foi se o presidente do PL Ceará, Acilon Gonçalves, também deveria sofrer sanção pela fraude à cota de gênero.

O TRE-CE formou maioria pela cassação da chapa do PL, o que inclui quatro deputados estaduais eleitos – Carmelo Neto, Dra. Silvana, Alcides Fernandes e Marta Gonçalves. A conclusão do julgamento, no entanto, foi adiada após o presidente do Tribunal, desembargador Inácio Cortez, pedir vistas.

Entre os quatro magistrados que reconheceram a existência de candidaturas fictícias na chapa do PL que concorreu à Assembleia Legislativa, dois foram contrários à punição de Acilon.

A juíza Kamille Castro – que abriu a divergência após o relator da ação, Raimundo Nonato Silva Santos votar contra a cassação da chapa – afirmou que "não foi produzida nenhuma prova que trouxesse convicção inequívoca de que o investigado Acilon praticou diretamente ato destinado a fraudar cota de gênero, deliberadamente por meio de ação ou omissão de sua parte".

Portanto, não seria possível aplicar a sanção de inelegibilidade apenas pela "presunção de que o presidente da legenda, por sua posição hierárquica consinta ou detém conhecimento sobre os atos de gestão praticados por seus subordinados".

Ela citou depoimento de Acilon Gonçalves, no qual este afirmava que a responsabilidade quanto a convites a candidatos e candidatas, verificação de documentação e triagem final para definição de quais candidaturas seria lançadas ficaria a cargo do secretário-executivo, Carlos Henrique Magalhães.

O juiz Raimundo Deusdeth Rodrigues Júnior apontou, no entanto, que esta delegação feita por Acilon "não isenta de responsabilidade o presidente do partido".

"Ademais, considerando a importância da regularidade dos atos partidários, cujas falhas podem inviabilizar a candidatura de toda a chapa, não é crível que o presidente não tivesse ingerência sobre a lista de candidatos e não estivesse a par de uma fraude das proporções denunciadas".

Raimundo Deusdeth Rodrigues Júnior

Magistrado do TRE-CE

Impacto do entendimento do TSE

Por enquanto, existe maioria formada, pelo TRE-CE, para não punir Acilon Gonçalves. Como o julgamento ainda não foi concluído, existe a possibilidade de mudança no voto, embora seja pouco comum que isso ocorra na Corte.

A mudança no entendimento no TSE também deve ter pouco impacto nesta decisão, explicam as especialistas ouvidas pelo Diário do Nordeste. Primeiro, porque o principal foco da proposta da ministra Maria Cláudia Bucchianeri é a inclusão dos dirigentes partidários no processo – o que já havia sido feito no caso da ação contra o PL Ceará.

Além disso, explica Amanda Guimarães, existe a "regra da anualidade", em que entendimentos do Tribunal Superior passam a ter efeitos práticos depois de um ano, ou seja, nesse caso os efeitos devem ser aplicados a partir das eleições de 2024.

Raquel Machado, no entanto, reforça, quanto à inelegibilidade de Acilon, "pode ser que no TSE, a situação mude". Nesse caso, seria menos sobre os efeitos do novo entendimento proposto por Bucchianeri e mais pela análise de eventual recurso apresentado à Corte Superior e, por consequência, das provas presentes no processo.

Fonte: Diário do Nordeste

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