Na tarde desta quinta-feira (13/06), das 14hs às 15:30, a Escola de Ensino Médio José Waldemar de Alcântara e Silva com iniciativa dos alunos (a) do 1Âș Ano "A", promoveram um debate com o tema ViolĂȘncia PolĂtica de GĂȘnero.
Para participarem dos debates, as alunas convidaram as vereadoras, Eridiana Ribeiro (PT) Sub-Procuradora da Mulher na Câmara, Prof.ÂȘ ClĂĄudia Lavôr (PT) Procuradora Geral da Mulher na Câmara e Socorrinha de Ronaldo (PT) Sub-procuradora da mulher. Na oportunidade, as parlamentares abordaram a Lei 14.192/2021 que estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violĂȘncia polĂtica contra a mulher.
Na oportunidade foi perguntado pelas as alunas quais os desafios e frustrações jĂĄ encontrada durante o mandato das parlamentares
A igualdade entre homens e mulheres em nosso paĂs deu um grande passo com a Constituição Cidadã de 1988, mas ainda atravessa grandes desafios, cujo reforço foi feito por meio da sanção da Lei nÂș 14.192/2021, que traz instrumentos de enfrentamento à violĂȘncia polĂtica de gĂȘnero.
O caminho para se alcançar os direitos polĂticos das mulheres no Brasil iniciou-se com o Código Eleitoral de 1932 e com a Constituição de 1934, instrumentos jurĂdicos que garantiram o direito da mulher ao voto. Em 1962, surge o Estatuto da Mulher Casada, legislação que regulamentava a situação jurĂdica diferenciada desta, pois o Código Civil de 1926 não permitia à mulher ter profissão, receber herança, entre outras vedações. Elas passam a ter direito sobre os filhos, compartilhando o então pĂĄtrio poder, podendo até mesmo ficar com a guarda.
No âmbito internacional, homens e mulheres foram igualados na Declaração de 1948, apesar de não nominalmente. Apenas em 1966, quando da promulgação do Pacto Internacional dos Direitos Civis e PolĂticos, houve a igualdade nominal-formal entre homens e mulheres explicitamente em um documento do Sistema das Nações Unidas. No Sistema de Direitos Humanos Americano, a inclusão dos direitos das mulheres se deu por meio da Declaração de Lima em favor dos Direitos da Mulher em 1938.
Mais efetivamente após a conquista do voto, os espaços de poder e a representação passaram a fazer parte dos debates sobre direitos civis e polĂticos, bem como o conceito de cidadania. Os nĂșmeros indicam a baixa representatividade de minorias/maioria nos Parlamentos mundiais. Quando se analisa o Brasil, é reduzido o nĂșmero de participação de mulheres, assim como de negros, de indĂgenas, de jovens, de pessoas com deficiĂȘncia e de pessoas LGBTQIA+.
Antes mesmo da garantia do direito ao voto, em 1932, temos o caso de Alzira Soriano, em Lajes (RN), a primeira mulher eleita prefeita na América Latina. Durante sua campanha eleitoral, em 1928, sofreu ofensas misóginas, com insinuações de que tinha um caso com o governador ou que, sendo uma "mulher pĂșblica", era prostituta. Foi eleita com 60% dos votos e assumiu o cargo em 1929, mas na eleição presidencial de 1930 apoiou JĂșlio Prestes e, como a Revolução de 1930 levou GetĂșlio Vargas à presidĂȘncia, todos os prefeitos do paĂs foram substituĂdos por interventores e, apesar de ser convidada a permanecer governando a cidade, não aceitou o cargo de interventora municipal e deixou a gestão do municĂpio.
O caso de Alzira mostra como as mulheres sofrem uma violĂȘncia diferenciada durante a campanha, antes mesmo de assumirem um cargo. Com a internet, esse tipo de calĂșnia e difamação nos dias de hoje ganha um contexto ainda maior, que perpassa os limites do seu próprio território.
Quando eleitas, a violĂȘncia se torna mais evidenciada, quando não são indicadas como titulares nas comissões, nem lĂderes dos seus partidos ou relatoras de projetos importantes, que trarão notoriedade. Também são constantemente interrompidas, não são chamadas para debates que não sejam ligados ao cuidado ou questionadas sobre suas roupas, aparĂȘncia fĂsica ou peso, como se essas caracterĂsticas influenciassem no exercĂcio do mandato ou da função. As mulheres também são constantemente questionadas sobre seus relacionamentos e sexualidade, além de serem taxadas com "mĂĄs mães", jĂĄ que não estão em casa cuidando dos filhos [1].
Assim, vĂĄrios aspectos perpassam e contribuem para a representação polĂtica minoritĂĄria de uma maioria populacional. No caso das mulheres, uma das causas da sub-representação das mulheres no Parlamento e nos espaços de poder e decisão é a violĂȘncia polĂtica de gĂȘnero. As mulheres sofrem violĂȘncia antes de concorrerem, quando concorrem e também quando são eleitas.
De forma a enfrentar essas prĂĄticas nocivas, a nova lei objetiva prevenir, reprimir e combater a violĂȘncia polĂtica contra a mulher, nos espaços e atividades relacionados ao exercĂcio de seus direitos polĂticos e de suas funções pĂșblicas, e para assegurar a participação de mulheres em debates eleitorais e dispõe sobre os crimes de divulgação de fato ou vĂdeo com conteĂșdo inverĂdico no perĂodo de campanha eleitoral.
Para cumprimento dos fins propostos, reafirma a garantia dos direitos de participação polĂtica da mulher, bem como a vedação de prĂĄticas de discriminação e de desigualdade de tratamento em virtude de sexo ou de raça, tanto no acesso das instâncias de representação polĂtica como no exercĂcio de funções pĂșblicas.
Quanto ao exercĂcio da representação polĂtica e a função pĂșblica, Gruneich e Cordeiro trabalharam com o tema em artigo de anĂĄlise sobre o antigo projeto de lei em discussão, trazendo o diĂĄlogo entre os conceitos de democracia e representação, defendendo que a representação polĂtica que trata a norma não deve ser confundida com representação eleitoral ou com função pĂșblica. A representação deve ser vista como o fornecimento de mandato para a substituição na tomada de decisões nos demais ambientes polĂticos (não apenas eleitorais), como sindicatos, associações de classes, associações em geral etc., não apenas os mecanismos formais de disputa de pleitos eleitorais formais.
EstĂĄ reafirmada a garantia dos direitos de participação das mulheres, com o estabelecimento de prioridade para o "imediato exercĂcio do direito violado", dando efetiva importância às declarações da vĂtima e aos elementos indiciĂĄrios (artigo 2Âș e seu parĂĄgrafo Ășnico). Apesar do artigo 2Âș trazer esse princĂpio mais aberto, os demais artigos da referida lei restringem a configuração da violĂȘncia polĂtica contra a mulher para ações no perĂodo eleitoral ou no exercĂcio de mandato eletivo ou durante a campanha eleitoral.
Quanto aos instrumentos stricto sensu, houve a inclusão de dispositivos no Código Eleitoral, com a atualização do tipo penal de "divulgação de fatos inverĂdicos", constante do caput do artigo 323. Agora esse crime não estĂĄ restrito apenas à propaganda eleitoral, mas também àquelas divulgações que ocorram durante o perĂodo de campanha eleitoral em outros meios. Atualiza o tipo penal ao acrescentar como crime quem produz, oferece ou vende vĂdeo com conteĂșdo inverĂdico acerca de partidos ou candidatos. Foi incluĂda clĂĄusula de aumento de pena quando este crime envolver menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou à sua cor, raça ou etnia.
Houve a proibição de propaganda partidĂĄria que deprecie a condição da mulher ou estimule sua discriminação em razão do sexo feminino, ou em relação à sua cor, raça ou etnia, com a inclusão de novo inciso ao artigo 243 da Lei nÂș 4737/1965.
O texto legal inova com a inclusão de tipo penal especĂfico, de forma a garantir que as prĂĄticas de assédio, constrangimento, humilhações, perseguições ou ameaça, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, havendo o menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou à sua cor, raça ou etnia, tendo como finalidade impedir ou dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo.
Ademais, para os crimes de calĂșnia, difamação e injĂșria eleitorais aumenta-se a pena em um terço quando estes ocorrerem com menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou à sua cor, raça ou etnia ou por meio da rede de computadores, de rede social ou transmitido em tempo real.
A responsabilização se darĂĄ também aos partidos polĂticos, com proposta de ajuste na Lei nÂș 9.096/1995, ao se incluir nos conteĂșdos obrigatórios do estatuto partidĂĄrio a prevenção, o sancionamento e o combate à violĂȘncia polĂtica contra a mulher, que deverão adequar seus estatuto 120 dias da publicação da norma.
Hoje as mulheres são a maioria da população brasileira, com 51,8%; maioria do eleitorado, com 53% dos 150 milhões de eleitores/as e 45% das filiadas aos partidos polĂticos. Mas apenas 15% dos/as eleitos/as para a Câmara dos Deputados e 14,8% para o Senado Federal.
Nos quase 90 anos do voto feminino e nos quase 200 anos da Câmara dos Deputados, foram eleitos 7.333 deputados, incluindo suplentes, enquanto as mulheres ocuparam apenas 266 cadeiras, mesmo com a obrigatoriedade de 30% de candidaturas femininas. Mesmo com as ações afirmativas, o Brasil ainda figura, segundo a ONU, em 142Âș lugar no ranking de representação feminina entre 191 nações citadas no mapa Global de Mulheres na PolĂtica da Organização das Nações Unidas e o nono lugar entre 11 paĂses da América Latina.
Os pesquisadores Pedro Ag dos Santos e Farida Jalalzai lançaram em fevereiro de 2021 nos Estados Unidos o livro "Women"s Empowerment and Disempowerment in Brazil: the Rise and Fall off President Dilma Rousseff " ("Empoderamento e Desempoderamento das Mulheres no Brasil: Ascensão e Queda da Presidente Dilma Rousseff"). O livro aponta que o machismo teve papel destacado no processo de impeachment de Dilma Rousseff. Para os autores da obra, a ascensão da petista à presidĂȘncia suscitou uma reação desvairada que buscava não apenas tirĂĄ-la do poder, mas também enfraquecer a participação de mulheres na polĂtica. Segundo os pesquisadores, a experiĂȘncia de Dilma mostra que conquistar o poder é apenas um dos grandes entraves que mulheres enfrentam ao ingressar na polĂtica. MantĂȘ-lo é um desafio por si só.
Por tudo isso, divulgar esse importante instrumento jurĂdico para a sociedade é imprescindĂvel. Cada vez mais as mulheres tĂȘm de estar cientes de seus direitos e o aparato estatal deve estar preparado para o recebimento dessas novas demandas.