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Os estados de Ceará e Pernambuco se uniram e vão tentar resolver pacificamente um problema da divisa que atinge 12 municípios.
Sem um estudo de campo e ou conhecimento dos municípios e estados, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mudou a divisa para fins de contagem da população entre os anos de 2000 e 2007.
O problema só foi percebido em 2022, quando a Justiça Eleitoral informou o município de Salitre (CE) da mudança de seções de votação na região da Serra dos Nogueiras, que passaram a pertencer ao município de Ipubi (PE). "Isso gerou um constrangimento à época", afirma o prefeito Rondilson Ribeiro (PT).
Por se tratar de divisa entre estados, a prefeitura procurou o governo cearense. Mas o problema, segundo o Ipece (Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará), que fez estudo sobre a área, vai além da cidade de Salitre.
Isso acabou mexendo em uma área de 773 km², alterando assim a contabilidade da população e critério para repasse de verbas aos municípios. Os dois estados entendem que houve prejuízo e por isso tentam um acordo.
Com a mudança, houve:
O prefeito Rondilson Ribeiro afirma que os moradores da Serra dos Nogueiras são atendidos por serviços públicos de Salitre, mas o município não recebe parte dos recursos porque a contabilidade da população está sendo feita para a cidade vizinha.
"A prefeitura tem feito mobilizações e conta com apoio da população porque a sua grande maioria se identifica com o cearense desde sua origem", diz.
Além disso, como a distribuição de recursos federais usa como critério a população de cada município para rateio da verba, Salitre perde dinheiro todos os meses. A principal dela é o FPM (Fundo de Participação dos Municípios), principal fonte de renda da cidade.
Nessa região nós temos uma escola, uma creche, uma unidade básica de saúde, além de quadra e praça. Os agricultores são beneficiados pelo programa Garantia Safra da gente. Tudo é a gente que dá, mas o único recurso que o município recebe é o por aluno, os demais estão indo para Ipubi.
Rondilson Ribeiro
O problema chegou às assembleias dos dois estados, que realizam conversas para fazer leis que encerrem o problema.
O coordenador do Comitê de Estudos de Limites e Divisas Territoriais da Alece (Assembleia Legislativa do Ceará), Luiz Carlos Mourão, explica que os estados já combinaram e vão assinar um termo de cooperação técnica para chegarem a uma solução sem a necessidade de judicializar o caso —como foi feito pelo Piauí ao entrar com ação no STF pela mudança da divisa com o Ceará.
"Aprendemos muito com esse caso com o Piauí e não queremos que se repita", diz Mourão.
Ele afirma que as duas casas já têm aprovado os termos do acordo e ambos aguardam a volta do recesso para seus presidentes assinarem e, assim, iniciarem os trabalhos detalhados na região. "As casas voltam em fevereiro e vamos iniciar o trabalho de campo", afirma.
Segundo Kleber Nascimento, analista de políticas públicas do Ipece, os termos do acordo de cooperação técnica preveem que as áreas serão definidas conforme estão ocupadas e administradas por cada um dos estados. "Não será a escolha uma linha entre 2000 e 2007, e sim um traçado conforme o pertencimento da população", diz.
Esse critério, consagrado no direito internacional e aplicado em contextos de delimitação territorial, assegura a prevalência da situação administrativa histórica e do sentimento de pertencimento da população. Portanto, as áreas tradicionalmente ocupadas pelo Ceará e por Pernambuco continuarão sob suas posses.
Kleber Nascimento
Nascimento conta que mesmo com a mudança na contagem da população, os municípios seguiram na administração de escolas, unidades de saúde e infraestrutura e serviços públicos, de acordo com a situação estabelecida antes da mudança.
"É fundamental que a atualização cartográfica garanta que a gestão pública permaneça alinhada à realidade histórica e administrativa das áreas impactadas. Dessa forma, assegura-se a continuidade e qualidade dos serviços prestados à população, sem prejuízos decorrentes de mudanças territoriais", pontua.
Em dezembro, a Comissão de Assuntos Municipais da Alepe (Assembleia Legislativa de Pernambuco) também discutiu o tema com representantes da Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco.
Segundo a engenheira cartográfica Lorena Iumatti, é interesse dos dois estados que a situação se resolva sem conflitos.
O impasse foi gerado há quase duas décadas sem conhecimento dos dois estados e que gerou por todos esses anos prejuízos a ambos. Não foi o caso de um estado invadindo território de outro. Apenas uma diferença de interpretação da linha divisória entre os envolvidos.
Lorena Iumatti
Procurado pela coluna, o IBGE informou que "não é o órgão que delibera sobre divisas e limites, embora eventualmente seja consultado." "Essa deliberação cabe às Assembleias Legislativas e ao Congresso Nacional."
Fonte: UOL